Hoje é o Dia dos "Artistas"

Hoje é o Dia dos "Artistas"

Nos últimos meses, assistimos a um cenário que, para quem conhece por dentro a realidade sindical das forças de segurança, se torna difícil de compreender e ainda mais difícil de explicar ao público. Em julho de 2024, o Governo, os sindicatos da PSP e as associações representativas da GNR assinaram um memorando de entendimento destinado a um processo negocial sério: melhoria das tabelas salariais, atualização de subsídios, progressão nas carreiras e revisão dos sistemas de avaliação.

Apesar de todas as estruturas terem sido chamadas ao processo, alguns sindicatos da PSP decidiram não subscrever o acordo, embora estivessem presentes nas reuniões. Ficaram de fora por opção própria — e, ao fazê-lo, garantiram também a liberdade para criticar, sem compromisso, quem assumiu a responsabilidade de negociar. Ainda assim, o memorando contou com os sindicatos mais representativos de todas as categorias da PSP e da GNR, assegurando legitimidade àquilo que foi assinado.

Porém, após algumas reuniões, o Governo deu um passo inesperado: fez tábua rasa do acordo, ignorando o documento que tinha negociado, apresentando uma nova agenda negocial. O compromisso assumido em julho foi pura e simplesmente empurrado para a gaveta. Perante este desrespeito pelas regras básicas de confiança e boa-fé, a direção da ASPP/PSP informou o MAI, na reunião de 28 de novembro, que não continuaria a participar em encontros cuja única consequência prática fosse adiar decisões e esvaziar compromissos.

O Governo voltou a convocar para hoje uma reunião, sem assumir a retoma da discussão do memorando assinado. E, tal como tinha comunicado previamente, a ASPP/PSP decidiu não comparecer. Não por capricho, mas porque não há negociação possível quando a própria base — o acordo firmado — é ignorada unilateralmente pelo Ministério da Administração Interna.

Curiosamente, alguns dos sindicatos que, em julho, se afastaram do acordo e que desde então teceram duras críticas às estruturas que o assinaram, decidiram agora sentar-se à mesa com o MAI. Estes mesmos sindicatos, que ao longo dos últimos meses alimentaram divisões internas, parecem hoje dispostos a participar num processo cujo ponto de partida é precisamente a negação do único entendimento formal existente.

Entretanto, é conhecido que o MAI mantém na sua agenda o aumento dos serviços remunerados — vulgarmente apelidados de “horas extra” — cujos custos recaem sobretudo sobre entidades privadas que recorrem à PSP para serviços de segurança. Será essa a matéria que hoje justifica tanta pressa negocial? Ou será apenas um exercício de gestão política em vésperas de eventuais decisões mais difíceis?

Para alguns, “hoje é o dia dos artistas”. Que assim seja. Talvez consigam produzir o tão aguardado número de ilusionismo que devolva aos profissionais das forças de segurança aquilo que lhes foi prometido — dignidade, coerência e respeito institucional. Da minha parte, estando fora de qualquer benefício direto destas negociações, não deixo de desejar que se encontre, finalmente, uma saída honrosa para este impasse criado pelo próprio Governo.

Porque os profissionais da PSP e da GNR merecem mais do que espetáculos.
Merecem soluções.

12.12.2025

Alberto Torres
Ex-Presidente da ASPP/PSP

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